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Esposa conta história com Gilberto Miranda, ex-suplente de Amazonino Mendes e o acusa de golpe


No Amazonas, Gilberto Miranda disputou três eleições ao Senado como suplente, e nas três assumiu o mandato — o mais longevo de 1992 a 1999, no PFL, quando Amazonino Mendes renunciou ao se eleger prefeito. (Foto: João Sal/Folhapress)



Por Bruno Ribeiro/VEJA



O amor é lindo e, no caso da paixão entre o ex-senador pelo Amazonas Gilberto Miranda e a empresária Carolina Andraus Lane, os dourados anos de romance foram embalados por uma vida de luxo e ostentação.


Eles ficaram juntos de 2004 a 2016, flanando entre duas mansões no Jardim Europa, em São Paulo — uma para reuniões e jantares com empresários e figurões da política; outra reservada aos amigos mais íntimos.


Os casarões eram decorados pela maior coleção da América Latina de arte moderna e impressionista, incluindo quadros de artistas como Picasso, Renoir, Monet, Chagall e Bonnard, avaliada em 34 milhões de reais. Sobre os móveis ingleses, mantinham conjuntos de porcelana estimados em 100 000 reais e mais de duas centenas de objetos de prataria.


Os deslocamentos para a Ilha das Cabras, um paraíso particular de Miranda no arquipélago de Ilhabela, no Litoral Norte paulista, eram feitos em um helicóptero de 8 milhões de reais ou em um gracioso veleiro dos anos 1920. Para viagens mais longas, utilizavam um jatinho Cessna. Na garagem, entre carros de luxo, tinham à disposição dois Rolls-­Royces vintages. “Tinha uma vida de tudo o que uma pessoa pode sonhar e mais”, lembrou Carolina a VEJA.


Durante os anos de ouro, o casal era presença constante nas colunas sociais e de política. Carolina fez editoriais de moda para revistas e era tida como uma das melhores anfitriãs de São Paulo, sempre com joias e vestidos famosos ao lado do marido, cuja adega de vinhos era célebre entre os políticos. De 2019 para cá, entretanto, esse mundo de sonhos ruiu e deu lugar a uma feroz batalha nos tribunais paulistas pelo naco de uma fortuna estimada em 1 bilhão de reais.


Carolina move uma ação contra o agora ex-marido exigindo ao menos 246 milhões de reais. Segundo ela, que afirma ter saído do relacionamento de mãos quase vazias, considerando o padrão de vida que levavam, o impressionante patrimônio era fruto do trabalho conjunto do casal, e não apenas de Miranda, que ficou com tudo.


O ex-senador não comenta o assunto e seu advogado, Rui Celso Fragoso, defende a tese de que a ex não tem nenhuma razão em suas queixas. “Eles se casaram em regime de separação total dos bens”, afirma. Carolina, por sua vez, sustenta que grande parte da fortuna de 1 bilhão de reais foi amealhada quando os dois estavam juntos.


Quando se conheceram, por intermédio de uma filha do ex-senador que era amiga de Carolina, ela tinha 30 anos e ele, 67.


De acordo com Carolina, o homem experiente, inteligente e charmoso encantou a moça que havia crescido sem a presença do pai. “Encontrei segurança nele”, resume. Carolina era formada em administração pela Fundação Getulio Vargas, com mestrados em Harvard e Columbia, nos Estados Unidos, e tinha uma grife de moda e experiência no mercado financeiro.


Na época em seu terceiro e último mandato no Senado, Miranda já engrossava a fileira de políticos que chamavam atenção pela capacidade de fazer negócios. No caso dele, o fenômeno teve uma particularidade: o patrimônio começou a se multiplicar abrindo empresas na Zona Franca de Manaus entre os anos 70 e 80, mesmo sem ter dinheiro para bancá-las.


A carreira pública de Miranda também é fora do comum. Natural de São José do Rio Preto, no interior paulista, mudou-se para Brasília no fim dos anos 1960, onde foi segurança e instrutor de natação de políticos. Formado em direito, usou os contatos que tinha na capital federal para facilitar a vida de empresários da Zona Franca, até virar sócio de alguns deles e se fixar em Manaus em 1974.


No Amazonas, disputou três eleições ao Senado como suplente, e nas três assumiu o mandato — o mais longevo de 1992 a 1999, no PFL, quando Amazonino Mendes renunciou ao se eleger prefeito.


O nome de Miranda já apareceu em investigações da Operação Castelo de Areia, que apurava desvio em obras, e do Dossiê Cayman (conjunto de documentos falsos criados para comprometer políticos do PSDB em 1998). Ele foi alvo de ao menos doze ações penais na Justiça Federal, mas nunca foi condenado.


Foi a partir de um negócio tocado em conjunto na época em que eram casados, segundo a versão apresentada por Carolina à Justiça, que Miranda deu um salto formidável e entrou para o clube dos bilionários. O pote de ouro foi a estruturação de um terminal de contêineres do Porto de Santos, cuja concessão foi vendida à MSC, a segunda maior empresa de logística do mundo, por 240 milhões de dólares em 2006. Embora Miranda já fosse um empresário com contatos importantes no país, Carolina diz que foi ela quem localizou os compradores no exterior. “Ele nem fala inglês”, afirma. Nas quase 6 000 páginas do processo, ela anexa contas de telefone e recibos das mais de trinta viagens que fez à Europa até finalizar o negócio. Procurada por VEJA, a MSC não retornou os contatos.


A discussão sobre os dividendos dessa transação foi um dos principais motivos da separação, sendo que a crise conjugal começou a ficar insuportável a partir de novembro de 2012. Na época, Carolina se lembra de ter sido acordada por empregados na mansão do Jardim Europa com os agentes da Polícia Federal na porta e de observar, de roupão, sentada na cama com seus cinco cachorros da raça vizsla, os policiais trabalhando com um profissionalismo impressionante”. Miranda estava sendo alvo da Operação Porto Seguro, que investigava a emissão de pareceres fraudulentos para empresários ocuparem áreas públicas — no caso, a ilhota em Ilhabela (que ele foi obrigado a devolver em 2021 após ação do Ministério Público) e a área do lixão do Alemoa, no Porto de Santos, justamente o local restaurado e oferecido aos europeus da MSC.


A investigação se arrastou por anos, mas não prosperou. Em 2021, a Justiça trancou as ações penais após anular as provas obtidas. Na época da operação, segundo Carolina, a possibilidade de envolvimento de Miranda em ilícitos era “impensável”.


Ela sustenta que não tinha suspeitas sobre o marido, mas passou a temer novas acusações. Por isso, começou a pedir para que seus bens fossem separados dos de Miranda. E por “seus bens” ela entendia ao menos metade dos valores obtidos com o porto, que, corrigidos, chegam a 1 bilhão de reais.


Sem levar até agora nenhum tostão dessa fortuna, Carolina acredita que tenha sido vítima de um golpe por parte do ex. Segundo ela, quando passou a exigir a sua parte dos bens, Miranda e seu advogado americano simplesmente teriam trocado páginas do contrato e retirado o seu nome de um fundo no exterior no qual esse dinheiro da transação estava depositado. Ela diz que não tinha cópia do documento porque confiou no marido. “Hoje, percebo que ele nunca teve a intenção de compartilhar os bens comigo”, afirma.


O que estava ruim, no entanto, podia piorar. Entre 2012 e 2016, ainda na versão dela, veio a crise mais aguda da relação: o homem charmoso teria se transformado em uma pessoa agressiva e abusiva, o que a levou a abandonar as duas mansões — e seus 106 empregados e carros de luxo — e ir morar numa pequena casa alugada em São Paulo, para onde se mudou levando apenas as malas. O advogado de Miranda, Rui Celso Fragoso, diz que ele nega ter praticado fraude e que Carolina já usou os mesmos argumentos no processo de separação do casal, que tramita agora no Superior Tribunal de Justiça. Na primeira instância e em decisão posterior, colegiada, o Tribunal de Justiça de São Paulo, ela acabou derrotada.


Carolina afirma só ter se recuperado psicologicamente da conturbada separação em 2019 e trabalha hoje na estruturação de projetos de infraestrutura. Afastado da política, Miranda atualmente administra negócios variados, como a principal distribuidora de gás do Amazonas. O imbróglio do casal confirma a tradição nacional de políticos assombrados na Justiça por ex-mulheres.





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